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A solução para velhos problemas

—Revista Construção Metálica - N°  63 - Abril de 2004 


"Os arquitetos têm uma resposta muito importante a dar para a solução dos problemas da habitação, e essa resposta passa pela utilização de novas tecnologias"

Em um encontro descontraído tão do agrado do arquiteto que prefere evitar as formalidades, Paulo Sophia, Presidente eleito do IAB de São Paulo para a gestão 2004/05, nos falou sobre suas expectativas e objetivos para a gestão que inicia, sobre o papel dos arquitetos no desenvolvimento de projetos de caráter social e sobre a aplicação de novas tecnologias na construção civil, enfatizando a necessidade de estreitar o relacionamento entre as entidades de classe, visando transformar os esforços individuais de cada instituição em esforços coletivos.


Sobre a responsabilidade do novo cargo, suas metas e objetivos

“É uma situação nova já que nunca tinha imaginado a possibilidade de galgar um cargo tão importante e de tanta representação. Fazendo parte da equipe do Arq. Gilberto Belleza por duas gestões como Vice-presidente financeiro, dava-me muito prazer estar no backstage do sucesso das empreitadas do Instituto. Este passo agora para uma condição de maior visibilidade exige uma postura um pouco diferente, e terei que me acostumar com a idéia de enfrentar os rigores do cargo, a sua pompa eventual e a sua formalidade, mas pretendo conduzir as coisas com a extrema simplicidade com que conduzo minha vida profissional, a minha carreira como arquiteto.
Estou satisfeito porque esta eleição foi resultado de nossa postura e atuação no IAB-SP, que notadamente se fortaleceu na última gestão da qual somos uma continuidade. Agora vamos trabalhar com uma série de objetivos que visam de um lado a continuidade dos esforços das diretorias anteriores e de outro, agregar um valor novo ao trabalho do Instituto do ponto de vista do seu relacionamento com o associado.

A qualidade de um projeto atinge seu maior impacto quando permite o uso coletivo, pois é no encontro das pessoas que a arquitetura ganha a sua maior força e expressividade. Queremos levar este mesmo conceito para a administração do Instituto, que deve tornar-se um verdadeiro ponto de encontro dos associados, um local onde fazer política para o benefício da arquitetura como expressão da cultura brasileira, e um local de convergência das discussões orientadas à defesa dos problemas habitacionais e dos problemas do meio ambiente natural e construído.

O nome de nossa chapa foi IAB forte / IAB dos Arquitetos. O IAB não é um espaço de amigos ou só para os amigos, é o ambiente natural onde colegas arquitetos se encontram com um objetivo comum que é a discussão das cidades e seus problemas, das novas tecnologias e dos novos materiais, e que é também local de discussão política, da discussão sobre a criação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo, sobre o CREA e sobre o controle dos arquitetos sobre sua carreira. Nós temos que encontrar no IAB um reflexo, uma transparência de nossa leitura da sociedade e dos grandes temas sociais que envolvem a arquitetura.

Então dessa forma e com essa visão política, a ênfase primordial de nosso trabalho vai ser dada com o Associado. Estamos instituindo uma gerência específica para ouvi-lo, conhecer suas necessidades e preocupações, para descobrir sua visão sobre os rumos que o IAB deve seguir. A voz do IAB não é a voz do Presidente, é a voz do seu Associado, e se este não participa a voz do IAB fica frágil, e nós temos que ser sempre uma voz contundente, marcante, que não se furte a falar o que precisa ser falado, no momento em que precisa ser falado.”

Sobre a 5a. Bia e os projetos com aço

“Parece-me que a Bienal, em sendo um evento internacional, também reflete a postura dos arquitetos brasileiros diante das tecnologias mais avançadas utilizadas internacionalmente. Ao analisar os últimos exemplos de arquitetura que mostram uma expressividade e dinâmica espacial, um resultado estético e um eco de atendimento às demandas de caráter social, é possível perceber em muitas deles o uso da estrutura metálica como uma ferramenta eficiente. Isso internacionalmente.

Os arquitetos brasileiros estão seguindo essa linha, buscando dar uma resposta eficiente em termos construtivos com características próprias. Vemos então variadas experiências sendo realizadas de norte ao sul do país com a aplicação das novas tecnologias. De qualquer forma a preocupação do arquiteto é a de oferecer o máximo de soluções com o mínimo, é isso que a tecnologia do aço associado a outras tecnologias de construção industrializada nos permite. Maiores vãos, economia de tempo e materiais, agilidade, a estrutura metálica é a grande ferramenta atual para atingir essas metas.

Em contrapartida nos tínhamos uma verdadeira dificuldade de visualizar o aço como uma ferramenta viável para atender o mercado de baixa renda, porque não tínhamos linhas de financiamento especificas. Fazia parte dos contratos a exclusão do aço, a construção tinha que ser de concreto e alvenaria, ou seja construção convencional. Na medida que a Caixa começa a oferecer financiamentos aonde tecnologias contemporâneas colocam-se a disposição para o atendimento da habitação de interesse social, percebemos finalmente um avanço,

A partir de agora é fundamental que os projetos realizados com base na construção industrializada se tornem exemplares, mostrando que podemos fazer uma arquitetura para a baixa renda, e não uma mera construção de caixas de sapato de reprodução em série que se desmancham em médio prazo. Nós temos que pensar em qualidade e durabilidade para a habitação de interesse social, porque ela faz parte da nossa paisagem. A cidade de São Paulo é nosso patrimônio, um meio ambiente construído que precisa ser resolvido, reciclado, recuperado, não apenas como objeto arquitetônico pois repito novamente o objeto arquitetônico só tem sentido quando as pessoas se encontram nele.”

Sobre a Construmetal 2004

Acho maravilhosa a oportunidade de recepcionar em nosso país nomes como Calatrava, Grinshaw e Mimram., é exatamente nesses encontros internacionais que se abrem as grandes possibilidades para o sucesso e a renovação. E só lembrar o quanto foi importante a vinda de Walter Gropius e como essa visita calou fundo no coração dos arquitetos paulistas. Lembrar da visita de Lê Corbusier, no Rio, e de como deixou sua marca no relacionamento com Lúcio Costa, com Niemayer e tantos outros.

É hora de reverter a situação destes últimos anos em que o país tem recebido a imposição de projetos importados (para shoppings, ou edifícios comerciais) onde não existe o intercâmbio, apenas a entrega do projeto para um profissional local incumbido de fazer uma tropicalização. Tem coisa mais ridícula do que esse próprio termo? Os arquitetos brasileiros têm muito mais a contribuir do que simplesmente tropicalizar! Qual é aqui a nossa contribuição? Entre os meus objetivos está o de fazer uma mostra do sucesso dos arquitetos brasileiros no estrangeiro e sobre o que eles levaram para o exterior como proposta, como contribuição. Nós temos jovens arquitetos trabalhando nos EEUU, na Europa, contribuindo para a arquitetura. Por exemplo Filomena Russo, que está na equipe de Norman Foster. Como é a experiência de essa arquiteta nessa equipe?

É sempre bom premiar, incentivar, divulgar. Assim como costumamos chamar a atenção para uma empresa que desenvolveu uma nova tecnologia ou um novo material, que permita obter melhores resultados, devemos também chamar a atenção para o trabalho de quem idealiza espaços que contribuem para a melhoria da qualidade de vida modificando a paisagem urbana pelo uso desses materiais. O arquiteto também tem muito a contribuir nesse sentido, porque é ele que pode oferecer para os empreendedores e os fabricantes, uma forma nova ou uma otimização do uso de esta ou aquela tecnologia.

Sobre a habitação de interesse social.

Temos alguns concursos em andamento e outros que estão sendo fechados pelo IAB, para o tratamento da questão habitacional. É muito importante que surjam novas soluções e que estas sejam incentivadas. Nos sabemos que a solução deste tipo de problema não depende do material ou da tecnologia. A solução do problema está nas idéias. Existem grandes idéias tanto com construção industrializada quanto com construção convencional. A grande questão é que se consiga dar escala para nosso problema. Precisamos de novas idéias para os nossos problemas que são monumentais

Falando do problema da habitação, construir uma casa por dia é pouco, o nosso povo vive em condições precárias. Temos que encontrar soluções de emergência, de caráter transitório e de caráter definitivo. Temos que atuar em varias frentes, a curto, médio e longo prazo. Não dá para passar uma borracha e apagar a favela da paisagem. O problema é como dar conforto numa moradia humanizada e com qualidade, não oferecendo apenas uma construção de baixo custo, pejorativa, em que quanto mais a família precisa menos ela recebe. As famílias de baixa renda são geralmente numerosas porque compartilham sua casa com mais pessoas. Precisamos incentivar a discussão de novos modelos de habitação, que atendam o que realmente essas pessoas precisam. Os projetos que existem no momento e que pretendem atender as necessidades destas famílias, tentam resolver em 36 a 42m² a alocação de uma família que na realidade vai ter 6, 8 ou mais indivíduos. É desumano.

Sobre como incentivar aos jovens arquitetos a abraçar as novas tecnologias

A mídia cumpre um papel muito importante na divulgação dos bons exemplos de arquitetura nacional e internacional, mostrando os grandes projetos que com a tecnologia do aço viabilizaram soluções para problemas candentes e para uma nova paisagem da cidade.

É necessário desenvolver um trabalho junto às universidades discutindo a inclusão e o aprofundamento do projeto em estrutura metálica e em estruturas mistas como ferramentas tão importantes quanto as das estruturas convencionais. E criar novos incentivos em termos de premiação, como é o prêmio da CSN, que é promovido pelo IAB de São Paulo, visando os trabalhos de graduação com estrutura metálica.

Estamos muito preocupados na continuidade dos eventos, os concursos são muito importantes, são formas de viabilizar uma visibilidade para trabalhos notáveis que venham a apresentar soluções novas para velhos problemas. Estreitando o relacionamento entre o IAB e a ABCEM, com uma participação efetiva de ambos nos eventos, promovendo a divulgação e fomentando a realização de mais cursos e palestras sobre o tema, dirigido aos arquitetos.

O IAB estará sempre à disposição da ABCEM e do setor da construção metálica, defendendo os interesses convergentes, no que tange a produção arquitetônica como expressão da cultura brasileira, dando ênfase as ações de atendimento as necessidades de nosso povo, com moradia adequada, com um desenvolvimento ordenado de nossa sociedade e o respeito ao meio ambiente natural e construído como patrimônio de todos. Acredito que temos interesses convergentes. E próprio da ABCEM o interesse no fomento do consumo do aço. É próprio do IAB o interesse no fomento do uso inteligente e criativo dessa tecnologia para a solução dos problemas. Assim temos convergência de interesses e objetivos comuns.

O instituto está sempre empenhado em fazer com que estas ações conjuntas cresçam e apareçam. Posso afirmar sem sombra de dúvida que os arquitetos têm uma resposta muito importante para a solução dos problemas da habitação das grandes cidades, e essa resposta passa tanto pela utilização do aço e da construção industrializada, quanto pela construção convencional com uso de novas tecnologias, garantindo um resultado com conteúdo cultural, qualidade construtiva, conforto ambiental, funcionalidade e beleza estética, onde o objeto construído será um objeto de orgulho coletivo.